Será que os empresários brasileiros estão prontos para sair da crise?
Esta semana, tive a clara impressão de voltar no tempo. Com a retomada da economia brasileira, o mercado começa a reagir e, por consequência, os empresários voltam a pensar em investimentos, comércio exterior, competitividade internacional etc. Esse clima de otimismo não está somente acontecendo no Brasil. Aqui na Europa, a percepção de que as coisas melhoraram no país também é grande. Em aproximadamente dois meses, uma delegação de empresários brasileiros realizará uma imersão em Barcelona e Berlim em busca de novas oportunidades e, principalmente, de boas práticas. A ideia é entender a pós-crise europeia e fazer um benchmarking da possível pós-crise brasileira. É exatamente aqui que eu volto sete anos.
Era setembro de 2012, durante o auge do "último milagre econômico" ou, como muitos gostam de dizer, do último "voo da galinha", quando eu tive a oportunidade de acompanhar um grupo de empresários do setor de material de construção em uma visita à Alemanha. Na época, essa experiência me rendeu um dos meus primeiros textos e um profundo sentimento de que estávamos para ultrapassar um dos maiores mitos do mindset brasileiro: o complexo de vira-lata.
Vem comigo então nessa recordação: a seleção estava formada e pronta para o jogo. Quatorze dos mais seletos protagonistas mineiros escalados entre vários que buscavam a chance de representar não só o rico estado de Minas Gerais, mas principalmente esta nova potência tupiniquim que todos (bem informados) lá fora idolatram.
Fora de um contexto temporal e literário, o título deste artigo, somado à passagem inicial, poderia até ser confundido com palavras de nosso ilustre Nelson Rodrigues, que na década de 50 usou o termo "Complexo de vira-latas" para definir a postura de inferioridade assumida pelos brasileiros após o trauma sofrido pela derrota na final da Copa de 50 para os uruguaios, em pleno Maracanã. Mas não. Estamos em 2012, agosto, e em plena Frankfurt, Alemanha. Nossos craques aqui em destaque não são os da arte dos gramados que por anos a fio foram sem dúvida a maior, para não dizer a única, representação brasileira no exterior.
"Nosso grupo é um dos maiores da Alemanha e somente esta loja que os senhores estão visitando, das mais de 200 que temos apenas na Alemanha, possui nada menos que 16.000 m² e 105 funcionários", disse orgulhoso o altivo Dobermann Ariano, encarregado de apresentar sua empresa, iniciando um curto diálogo:
– O senhor, por exemplo, quantos funcionários tem na sua maior loja? – perguntou o alemão visivelmente orgulhoso a um dos "pequenos vira-latas" da nossa querida República das Bananas.
– 650 – responde "humildemente" o representante verde-amarelo.
– Quantos? 150? – indaga de volta, agora com um ar mais surpreso que superior, o alemão.
– Não, o senhor não me entendeu bem. São 650 funcionários em nosso "modesto estabelecimento" de 25.000 m², o mais expressivo dos oito que possuímos, todos especializados somente no segmento elétrico – respondeu o brasileiro.
Esse diálogo ilustra um pouco o tom da experiência de 10 dias de imersão na Europa, nomeadamente Alemanha e Itália, para conhecer a realidade do mercado matcon (material de construção) na região.
A riqueza e abrangência da agenda técnica por si só já teria sido suficiente para justificar a iniciativa. Na Alemanha, a análise do mercado local – que na época estava muito orientado às grandes lojas de cadeias locais que têm na esmagadora maioria de seu mix produtos fabricados pela indústria nacional – serviu de exemplo para entender que um planejamento setorial, apoio do governo e uma valorização junto aos consumidores foram os alicerces básicos para a sustentabilidade e fortalecimento desse setor do varejo.
Já os workshops na Itália com duas associações nacionais de revenda de material de construção e ferramentas, somados às visitas a pequenos varejistas e redes locais, deixaram bem claro que somente uma real integração da cadeia de distribuição, onde a indústria soma esforços com o varejo em ações de mercado conjuntas que contam também com a participação do governo, foi fundamental para as pequenas empresas do setor sobreviverem à crise de 2008. Nada diferente da nossa realidade, não acha?
O difícil de mensurar na verdade são os ganhos intangíveis de iniciativas como essas como, por exemplo, o momento quase mágico em que vira-latas do antigo "terceiro mundo" se dão conta do seu real pedigree e se transformam em "neonobres", objetos de admiração e até inveja dos seus pares "ex-primeiro mundo". Um verdadeiro orgulho de ser (empresário) brasileiro.
Essas experiências internacionais não somente incentivam a discussão de novas práticas de gestão mas, também e principalmente, proporcionam ao empresário brasileiro a oportunidade de se avaliar e fazer uma releitura da posição de seu negócio em uma perspectiva muita mais ampla que a do seu mercado local.
Estou convencido que vamos iniciar um novo ciclo de prosperidade nacional e, por consequência, de protagonismo internacional. O Brasil será mais uma vez redescoberto e muito cobiçado pelo mundo. É fato que a nossa tradicional República das Bananas está, mais uma vez, se transformando aos olhos do mundo. Então, é fundamental que nós, brasileiros (governantes, estudantes, empresários, cidadãos) nos despeçamos o mais breve possível desse nosso antigo companheiro imaginário vira-lata que ainda insiste em se esconder no fundo do nosso inconsciente popular.
Temos que nos livrar urgentemente de frases como: "Isso não funciona por aqui" ou "É porque aí é o primeiro mundo". No Brasil, temos sim tecnologia de ponta sendo desenvolvida e muito potencial humano para fazer muito mais. Vamos lá então! Que venha esse novo ciclo de bonança, pois estamos preparados (espero).
Só conseguiremos evoluir para o conceito de cidades inteligentes quando tivermos uma mudança na mentalidade da sociedade. Provavelmente, esse seria um bom começo no caso particular do Brasil. Você já conseguiu eliminar ou somente escondeu o vira-lata que existe aí dentro? Participe dessa discussão. Deixe seus comentários aqui embaixo que terei o imenso prazer de responder. Um grande abraço e nos vemos no próximo texto.
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