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Renato de Castro

Pandemia acelera mudança para uma economia superlocal e hipertecnológica

Renato de Castro

12/05/2020 04h00

Após mais de 60 dias de quarententa, a Itália iniciou a retomada gradual das atividades (Kynastudio)

A quarta revolução industrial já batia nas nossas portas muito antes desta nova pandemia. Embora a tecnologia já houvesse começado a empoderar os cidadãos e a aumentar significativamente o protagonismo das nossas cidades, a verdadeira disrupção nunca foi a tecnologia em si, mas sim a velocidade das mudanças.

Estamos à beira de uma nova revolução. Se por um lado ela já vinha sendo fomentada pela digitalização do mundo e pela conectividade, que eliminou fronteiras e estimulou a troca de ideias, por outro estamos vendo o alvorecer de uma nova ordem mundial: a localização.

Para explicar de forma rápida e simples, seria literalmente o contrário da globalização, porém, se colocada dessa forma, acaba soando mais como um movimento do tipo ONG contra o capitalismo ou movimentos separatistas radicais quando, na verdade, está bem longe de ser isso.

Apesar de já ser uma tendência que vinha ganhando força ao longo da última década, principalmente aqui na Europa após a crise de 2008, foram poucas as vezes que vi o termo localização sendo defendido de forma didática em um contexto econômico mundial. De forma natural, as gerações Y (nascidos entre 1982-1994) e Z (1995-2010), sobretudo a última, também conhecida como pós-millennials ou centennials, já demonstravam uma preferência pela localização no seu estilo de vida e hábitos de consumo.

De acordo com o estudo "New Kids On The Block. Millennials & Centennialsdo Bank of America Merrill Lynch, hoje existem 2 bilhões de millennials e 2,4 bilhões de centennials, representando 27% e 32% da população mundial, respectivamente. Ou seja, eles já são a maioria dos habitantes do planeta e seu poder de compra influencia diretamente a economia global.

Com as gerações mais jovens tomando ponta, os principais elementos para a equação de uma nova economia mundial já estavam bem definidos: inteligência artificial, internet das coisas e todas as hipertecnologias relacionadas à quarta revolução industrial. Em paralelo, ainda estávamos lidando com as graves deficiências do modelo "tradicional" de globalização como a superconcentração da produção, um consumo mundial desordenado e as crescentes ameaças ambientais.

A crise mundial do covid-19 acabou sendo o catalisador que faltava para imprimir velocidade às mudanças. Bem-vindo ao novo mundo da economia KM 4.Zero, um novo paradigma que combina o superlocal (km zero) ao hipertecnológico (4.0) e que pode recuperar, ou ao menos mitigar, os efeitos econômicos da pandemia.

Como todas as pandemias, guerras e crises da história, esta também irá passar, porém, dificilmente retornaremos ao mesmo mundo que tínhamos antes. Pela primeira vez na história, países inteiros, como a Itália, foram forçados a ficar em quarentena. No nosso caso, mais de 60 milhões de pessoas ficaram isoladas em suas casas por mais de 60 dias. Teremos não somente as consequências econômicas, mas também sociais e psicológicas resultantes da pandemia.

Localizada na área do Veneto e com um pouco mais de cinco mil habitantes, Rovolon está a 10 quilômetros de distância do epicentro do COVID-19 na região, o que fez com que estejamos em quarentena desde o final de fevereiro (a medida só foi estendida para toda a Itália no dia 9 de março). Com literalmente todas as atividades econômicas fechadas e a população trancada em casa, juntos, como sociedade organizada, resolvemos assumir o controle de pequenas mudanças que teriam grande impacto. E funcionou*! Foi o início de um programa de recuperação da economia local que já está sendo usado como referência nacional.

Quando surgirá o próximo vírus? Virá da natureza ou de laboratórios? Estaremos prontos? Questões quase que existenciais farão parte do novo normal e uma coisa é certa: se nos últimos 10 anos estivemos aperfeiçoando os conceitos relacionados às cidades inteligentes, chegou a hora de começarmos a desenvolver as estratégias para cidades mais resilientes.

Nós já estamos escrevendo o primeiro capítulo da nova história aqui na Itália. Que venha a nova economia KM 4.Zero, afinal, já estávamos lhe esperando e, ao menos por aqui, estamos prontos.

*Clique na imagem abaixo para acessar o paper completo do case do "Programa de Recuperação Econômica Km 4.Zero".

 

Sobre o autor

Renato de Castro é expert em Cidades Inteligentes. É embaixador de Smart Cities do TM Fórum de Londres, membro do conselho de administração da ONG Leading Cities de Boston e Volunteer Senior Adviser da ITU, International Telecommunications Union, agência de Telecomunicações das Nações Unidas. Acumulou mais de duas décadas de experiência atuando como executivo global em países da Ásia, Américas e Europa. Fluente em 4 idiomas, é doutorando em direito internacional pela UAB - Universidade Autônoma de Barcelona. Renato já esteve em mais de 30 países, dando palestras sobre cidades inteligentes e colaborando com projetos urbanos. Atualmente, reside em Barcelona onde atua como CEO de uma spinoff de tecnologia para Smart Cities.

Sobre o blog

Mobilidade compartilhada, Inteligência artificial, sensores humanos, internet das coisas, bluetooth mesh etc. Mas como essa tranqueira toda pode melhorar a vida da gente nas cidades? Em nosso blog vamos discutir sobre as últimas tendências mundiais em soluções urbanas que estão fazendo nossas cidades mais inteligentes.